Peça Prático-Profissional: A Assembleia Legislativa do Estado Y edita, em 1º de março de 2015, a Lei nº 8888, que estabelece que a
concessionária exploradora do serviço de fornecimento de energia elétrica no território do Estado fica obrigada a
remover, sem qualquer ônus para os interessados, os postes de sustentação à rede elétrica que estejam causando
transtornos aos proprietários e aos promitentes compradores de terrenos.
Ressalta-se que não há qualquer Lei Complementar que autorize excepcionalmente ao Estado Y dispor sobre a
questão, sendo certo que, ao contrário, no âmbito federal existe norma expedida pela agência reguladora que
autoriza a remoção desses postes de energia, cujo serviço fica às expensas dos usuários interessados. Há notícia
também de que o Governador do Estado Y vetou integralmente o projeto de Lei Estadual, mas restou superado pela
vontade da Assembleia Legislativa do Estado, que, ao final, promulgou a referida Lei.
Diante da relevância e da urgência da questão, o partido político “Para Frente Brasil” – PFB, representado
unicamente por um Deputado Federal, procura os seus serviços para objetar contra a Lei Estadual, por entender que
a norma estadual viola diretamente a Constituição Federal.
Considerando os dados acima, formule a peça adequada, fazendo introito sobre a legitimidade ativa e observando
que o partido entende ser urgente a questão. (Valor: 5,00)
Responda justificadamente, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente
ao caso.
Gabarito Comentado pela FGV: O enunciado indica que a peça adequada a ser redigida é a Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI a ser
proposta perante o Supremo Tribunal Federal (Art. 102, I, “a”, da Constituição Federal). A petição deve ser
endereçada ao Ministro Presidente do Supremo Tribunal Federal.
O objeto da referida ADI será a Lei Estadual atacada e terá como parâmetro diversos dispositivos constitucionais.
O Partido Político possui legitimidade para propor a ADI (Art. 103, VIII, da Constituição Federal) e deve figurar
como autor da ação, pois é representado por Deputado Federal no Congresso Nacional. É considerado legitimado
universal para propor ADI e não se sujeita ao exame da pertinência temática, pois seu papel institucional já o
autoriza a promover tal ação em qualquer hipótese, conforme entendimento pacificado no STF: “Partido político.
Ação direta. Legitimidade ativa. Inexigibilidade do vínculo de pertinência temática. Os partidos políticos, desde
que possuam representação no Congresso Nacional, podem, em sede de controle abstrato, arguir, perante o STF,
a inconstitucionalidade de atos normativos federais, estaduais ou distritais, independentemente de seu conteúdo
material, eis que não incide sobre as agremiações partidárias a restrição jurisprudencial derivada do vínculo de
pertinência temática.” (ADI 1.407-MC, rel. min. Celso de Mello, julgamento em 7-3-1996, Plenário, DJ de 24-11-
2000.)
A Assembleia Legislativa do Estado deve ser indicada no polo passivo da ação e o Governador do Estado intimado
a prestar informações sobre o processo legislativo.
Os fundamentos da Ação Direta de Inconstitucionalidade devem ser:
a) Desencontro entre o dispositivo da legislação estadual e o Art. 21, XII, “b”, da Constituição Federal. A
imposição, por meio de ato normativo estadual, da obrigação de remover, sem custo para o usuário, postes
de sustentação da rede elétrica que estejam causando transtornos ou impedimentos a particulares
configuraria intervenção indevida do poder estadual em serviço púbico de titularidade da União. Trata-se de campo de distribuição constitucional de competência. É a denominada competência administrativa da
União.
b) Vulneração ao Art. 22, IV, da Constituição Federal, pela lei estadual, pois a Carta da República reserva à
União a competência privativa para dispor legislativamente sobre energia o que demarca primazia federal
sobre o tema a e não abre espaço para a atuação dos Estados e dos Municípios.
c) Afronta ao Art. 175, parágrafo único, inciso III, da Constituição Federal pela lei estadual. A lei estadual ao
dispor que a remoção dos postes fica a cargo da concessionária do serviço público, se imiscui na tarefa da
União para definir, por meio de lei, a política tarifária a ser observada na exploração deste serviço no que
tange aos elementos definidores do equilíbrio econômico-financeiro de contratos de concessão, isto é, na
ingerência na política tarifária do serviço público.
O examinando deve formular pedido de concessão de medida cautelar, com amparo no Art. 10, da Lei nº
9.868/99, a fim de suspender a vigência da lei estadual que entende ser inconstitucional. Os pressupostos da
medida cautelar devem ser apontados, ou seja, o fumus boni iuris e o periculum in mora. O primeiro
demonstrado a partir da violação das normas constitucionais e o segundo porque a lei estadual criou, para as
concessionárias de serviço público, uma obrigação de alto custo a ser prestada em hipóteses extremamente vagas
para o proveito de interesses individuais. Trata-se, de norma estadual que instituiu verdadeiro direito potestativo,
a ser exercido ao alvedrio pessoal de titulares de direito real sobre terrenos, impondo-lhes encargos
extraordinários, não previstos nos contratos de concessão celebrados com o poder concedente, e, com isso,
alterou a matriz de custos da prestação do serviço e rompeu com os parâmetros estipulados pela agência federal
do setor elétrico para a remoção de postes de energia.
No mérito, o examinando deve demonstrar que a Lei estadual fere dispositivos constitucionais, a repartição de
competências, ao princípio da razoabilidade/proporcionalidade.
Por derradeiro, o examinando deve formular, expressamente, pedido de concessão de medida cautelar e, ao final,
pedido de declaração de inconstitucionalidade.
Devem ser requeridas as oitivas do Advogado Geral da União, a fim de defender o ato normativo estadual e
também do Ministério Público.
Questão 1: Uma entidade de classe de servidores públicos ajuizou mandado de segurança coletivo contra decisão do Diretor
Geral de um dado órgão público federal. Alegou que a decisão administrativa por ele proferida deixou de considerar
direitos consolidados de uma das categorias que representa. O Diretor Geral informou ao seu advogado reconhecer
que a questão sobre a existência ou não do direito em discussão envolvia grande complexidade jurídica. Esclareceu,
ainda, que, apesar de alguns órgãos públicos aplicarem o direito almejado pelo impetrante, a maior parte não o
reconhecia.
Diante do relato acima, responda aos itens a seguir.
A) No caso em questão, havendo dúvidas quanto à certeza em matéria de direito, é possível movimentar o Poder
Judiciário pela via do mandado de segurança? Justifique. (Valor: 0,75)
B) A entidade de classe em questão possui legitimidade para impetrar o mandado de segurança coletivo, ainda que
a pretensão veiculada diga respeito a apenas uma parte da categoria que representa? Justifique. (Valor: 0,50)
Responda justificadamente, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente
ao caso.
Gabarito Comentado pela FGV: A) Sim. A existência de dúvida sobre matéria de direito não impede a movimentação do Judiciário pela via de
mandado de segurança. Sobre o tema o STF manifestou-se por meio da Súmula nº 625. Nesse sentido, a
exigência de direito líquido e certo para a impetração de mandado de segurança não se refere à inexistência
de “controvérsia sobre matéria de direito”, mas à inexistência de controvérsia sobre fatos, que devem ser
objeto de pronta comprovação.
B) Sim. A entidade de classe tem legitimidade para impetrar o mandado de segurança, ainda quando a pretensão
veiculada diga respeito a apenas a uma parte da respectiva categoria. É o que dispõe a Súmula nº 630 do STF
(“A entidade de classe tem legitimação para o mandado de segurança, ainda quando a pretensão veiculada
interesse apenas a uma parte da respectiva categoria”).
QUESTÃO 2: Faltando um pouco mais de um ano para as eleições estaduais, Prudêncio Ferreira, governador de um dos Estados da
Federação (Estado W), mesmo diante de grave crise política, decide que concorrerá a um segundo mandato, sem se
afastar do exercício de sua função. No seu entender, a referida crise política decorre do fato de não possuir, na
Assembleia Legislativa (do Estado W), além de seu filho Zacarias, um número maior de deputados aguerridos, que
defendam o seu governo, de forma contundente, dos insistentes ataques desferidos pela oposição. Por essa razão,
traça como estratégia política reforçar a sua base de apoio na Casa Legislativa, com pessoas que considera de sua
inteira confiança. Assim, submete à cúpula do partido que o apoia uma lista de candidatos a Deputado Estadual que
deveriam receber especial apoio no decorrer da campanha. Os seguintes nomes constaram da relação, todos com
mais de 21 anos:
- Marcos Ferreira, seu neto, bacharel em Direito, que jamais exerceu qualquer cargo político;
- Robervaldo Soberbo, seu sogro, que se encontra aposentado do cargo de fiscal de rendas do Estado W;
- Carlos Ferreira, seu sobrinho, que não exerce nenhum cargo político no momento; e
- Zacarias Ferreira, seu filho adotivo, político de carreira, que concorrerá à reeleição como deputado estadual no
Estado W.
Segundo a Constituição Federal, responda aos itens a seguir.
A) Dentre os nomes citados, quais estariam habilitados a concorrer ao cargo de Deputado Estadual do Estado W e
quais não estariam? Justifique. (Valor: 0,70)
B) Dentre os que não estariam habilitados a concorrer ao cargo de Deputado Estadual pelo Estado W, poderiam
eles concorrer ao cargo de Deputado Estadual por outro Estado? Justifique sua resposta. (Valor: 0,55)
Responda justificadamente, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente
ao caso.
Gabarito Comentado pela FGV: A) Podem candidatar-se Carlos Ferreira e Zacarias Ferreira, na forma do Art. 14, § 7º, da Constituição Federal.
Afinal, Carlos, na condição de sobrinho do Governador, mantém com este parentesco consanguíneo de
“terceiro grau”, pela linha colateral, sendo que a inelegibilidade atinge tão somente parentes (consanguíneos ou afins) até o segundo grau. No que diz respeito a Zacarias, embora seja ele filho adotivo de
Prudêncio (parentesco de 1º grau por adoção), o fato de já ser titular de mandato eletivo e estar
concorrendo à reeleição para o cargo de Deputado Estadual do Estado W, seu direito de concorrer está
assegurado em face da exceção prevista no mesmo dispositivo (“salvo se já é titular de mandato eletivo e
candidato à reeleição”). Não se adequam às condições para concorrer ao cargo em referência Marcos
Ferreira e Roberval Soberbo. O primeiro por manter com Prudêncio Ferreira parentesco consanguíneo de
segundo grau pela linha direta; o segundo por manter parentesco de 1º grau por afinidade com Prudêncio
Ferreira, por força do que estabelece o citado Art. 14, § 7º, da Constituição Federal.
B) Conforme acima referenciado, embora Marcos Ferreira e Robervaldo Soberbo não possam concorrer ao
cargo de Deputado Estadual do Estado W, por força do que estabelece o Art. 14, § 7º, da Constituição
Federal (“no território de jurisdição do titular”, no caso o Governador). Marcos por manter com o Prudêncio
Ferreira laço de parentesco consanguíneo de segundo grau pela linha direta; Roberval, por manter com
Prudêncio Ferreira laço de parentesco de 1º grau por afinidade. Ambos, porém poderiam concorrer ao cargo
de Deputado Estadual em qualquer Estado que não fosse W. Isso porque, no caso de governador, a
circunscrição eleitoral atingida pela norma da inelegibilidade será a do território do Estado “W”. Todavia,
satisfeitas as condições de elegibilidade presentes constantes no art. 14 da Constituição Federal, poderiam
disputar a eleição em outro Estado que não “W”, pois encontrar-se-iam fora da circunscrição territorial em
que Prudêncio exerce o mandato de Governador (Estado W), não estando abrangidos pelos casos de
inelegibilidade estabelecidos no âmbito do § 7º do citado Art. 14 da Constituição Federal.
QUESTÃO 3: Projeto de lei aprovado pela Câmara dos Deputados, contendo vício de inciativa, foi encaminhado ao Senado
Federal. Na Casa revisora, o texto foi aprovado com pequena modificação, sendo suprimida determinada expressão,
sem, contudo, alterar o sentido normativo objetivado pelo texto aprovado na Câmara. O projeto foi, então, enviado
ao Presidente da República, que, embora tenha protestado pelo fato de ser a matéria disciplinada pelo Parlamento,
de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, sancionou-o por concordar com os termos ali estabelecidos,
originando a Lei L.
Diante dos fatos narrados, responda aos itens a seguir.
A) A não devolução do processo à Casa Iniciadora sempre configurará violação ao devido processo legislativo?
Justifique. (Valor: 0,75)
B) No caso em tela, a sanção presidencial possuiria o condão de suprir o vício de iniciativa ao projeto de Lei?
Justifique. (Valor: 0,50)
Responda justificadamente, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente
ao caso.
Gabarito Comentado pela FGV: A) Não. A alteração de texto não implica, necessariamente, o retorno do projeto à Casa iniciadora, já que
mudança dessa natureza somente assume relevância se houver alteração do significado normativo. Nesta
linha: "Medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade. LC 101, de 4-5-2000 (Lei de
Responsabilidade Fiscal). MP 1.980-22/2000. (...) LC 101/2000. Vício formal. Inexistência. O parágrafo único
do Art. 65 da CF só determina o retorno do projeto de lei à Casa iniciadora se a emenda parlamentar
introduzida acarretar modificação no sentido da proposição jurídica."
B) Não. Confirmada a usurpação do poder de iniciativa, mesmo a sanção do projeto de lei não possui o condão
de afastar o vício de inconstitucionalidade formal. Neste sentido, a ulterior aquiescência do Chefe do Poder
Executivo, com a sanção, ainda quando dele seja a prerrogativa usurpada, não tem o condão de sanar o vício
de inconstitucionalidade. Restou superada a Súmula nº 5 do STF. Nesta linha: "A sanção do projeto de lei não
convalida o vício de inconstitucionalidade resultante da usurpação do poder de iniciativa. A ulterior
aquiescência do chefe do Poder Executivo, mediante sanção do projeto de lei, ainda quando dele seja a
prerrogativa usurpada, não tem o condão de sanar o vício radical da inconstitucionalidade. Insubsistência da
Súmula 5/STF. Doutrina. Precedentes."
QUESTÃO 4:
Durante a campanha eleitoral, determinado candidato a Deputado Federal acusa o Governador do Estado de liderar
atividades criminosas ligadas a bingos e cassinos clandestinos. Logo em seguida, o referido candidato é eleito. Após a
posse, o Procurador-Geral da República oferece denúncia contra o referido Deputado Federal, perante o Supremo
Tribunal Federal, pelo crime comum cometido. Em sua defesa, o parlamentar argumenta que se encontra amparado
pela inviolabilidade (imunidade material) quanto às suas opiniões, palavras e votos, razão pela qual não poderia
responder pelo crime que lhe é imputado.
Diante de tais fatos, responda aos itens a seguir.
A) Poderia o Procurador-Geral da República oferecer denúncia contra o Deputado Federal sem a prévia
autorização da Câmara dos Deputados? (Valor: 0,50)
B) Na hipótese de um Deputado Federal responder por crime comum perante o Supremo Tribunal Federal, o
término do mandato tem alguma consequência sobre a definição e manutenção da competência jurisdicional?
(Valor: 0,75)
Responda justificadamente, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente
ao caso.
Gabarito comentado pela FGV: A) Sim. Não há nenhuma necessidade de autorização prévia da Câmara dos Deputados a fim de dar início à ação
penal, tal qual dispõe o Art. 53, § 3º, da Constituição de 1988. Antes da promulgação da
EC 35/01, os Deputados e Senadores não podiam ser processados sem prévia licença da respectiva Casa
Legislativa. Entretanto, atualmente, permite-se a abertura de processo penal no Supremo Tribunal Federal
sem necessidade da licença prévia, sendo possível, apenas, pelo voto da maioria absoluta da respectiva Casa
Legislativa, sustar o andamento da ação. Ou seja, “recebida a denúncia contra o Senador ou o Deputado por
crime ocorrido após a diplomação, o Supremo Tribunal Federal dará ciência à Casa respectiva, que, por
iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da maioria de seus membros, poderá, até a
decisão final, sustar o andamento da ação”. Esse dispositivo (§ 3º, do Art. 53, da CRFB) aplica-se ao caso,
mesmo o crime tendo sido praticado antes da diplomação, por força das regras principiológicas que
informam as prerrogativas parlamentares.
B) Sim. A jurisprudência do STF evoluiu no sentido de não manter, após o término do mandato legislativo, o
foro por prerrogativa de função previsto no Art. 53, § 1º, da Constituição Federal. Com efeito, até agosto de
1999 era aplicada a Súmula nº 394 do Supremo Tribunal Federal, que preservava o foro para os atos praticados no exercício do mandato, mesmo após o término deste. Porém, a súmula foi cancelada e a
competência deixou de ser do Supremo Tribunal Federal. Portanto, a atual jurisprudência do STF entende
que o foro especial por prerrogativa de função não permanece após o término do exercício da função
pública. Ou seja, no término do exercício da função pública expira o direito ao foro especial por prerrogativa
de função, devendo o processo ser remetido à Justiça ordinária competente.