20 de set. de 2016

Segunda Fase - OAB - Domingo Passado (18/09/2016)

PEÇA PRÁTICO-PROFISSIONAL O Prefeito do Município Alfa, preocupado com a adequada conduta no seu mandato, procura o presidente nacional do seu partido político Beta, o qual possui representação no Congresso Nacional, e informa que a Lei Orgânica do Município Alfa, publicada em 30 de maio de 1985, estabelece, no seu Art. 11, diversas condutas como crime de responsabilidade do Prefeito, entre elas o não atendimento, ainda que justificado, a pedido de informações da Câmara Municipal, inclusive com previsão de afastamento imediato do Prefeito a partir da abertura do processo político. Informou, também, que a mesma Lei Orgânica, em seu Art. 12, contém previsão que define a competência de processamento e julgamento do Prefeito pelo cometimento de crimes comuns perante Justiça Estadual de primeira instância. Por fim, informou que, em razão de disputa política local, houve recente representação oferecida por Vereadores da oposição com o objetivo de instaurar processo de apuração de crime de responsabilidade com fundamento no referido Art. 11 da Lei Orgânica, a qual poderá ser analisada a qualquer momento. O partido político, após o devido trâmite interno estabelecido no seu estatuto, conclui que a norma municipal está em dissonância com a CRFB/88 e decide adotar providência judicial em relação ao tema. Considerando a situação narrada, na condição de advogado(a) do partido político Beta, utilizando-se do instrumento constitucional adequado, elabore a medida judicial de controle objetivo cabível. (Valor: 5,00) Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não confere pontuação. 


Gabarito Comentado pela FGV:  A peça adequada nesta situação é a petição inicial de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental. A petição deve ser endereçada ao Supremo Tribunal Federal, órgão judicial competente para processar e julgar a referida ação, conforme o Art. 102, § 1º, da CRFB/88 c/c o Art. 1º da Lei nº 9.882/99. O examinando deve indicar a legitimidade do partido político, que possui representação no Congresso Nacional, na forma do Art. 2º, inciso I, da Lei nº 9.882/99 c/c o Art. 103 da CRFB/88. O examinando deve justificar o cabimento da ADPF como única ação de controle concentrado de constitucionalidade cabível contra norma municipal e anterior à CRFB/88, na forma do Art. 1º, parágrafo único, inciso I, e do Art. 4º, § 1º, ambos da Lei nº 9.882/99. O examinando deve indicar o ato municipal impugnado (Art. 11 e Art. 12 da Lei Orgânica do Município Alfa). O examinando deve indicar e demonstrar justificadamente os preceitos fundamentais da CRFB/88 violados, quais sejam: (i) o Art. 2º (violação ao princípio da separação de poderes); (ii) o Art. 22, inciso I, (violação à competência legislativa exclusiva da União); e (iii) o Art. 29, caput e inciso X (que dispõem sobre os municípios e sobre as respectivas leis orgânicas, as quais devem observar os preceitos da Constituição da República, especialmente garantindo aos Prefeitos a prerrogativa de foro perante o Tribunal de Justiça em crimes comuns). Deve, ainda, mencionar o examinando a existência da Súmula Vinculante 46 do STF: “A definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento são de competência legislativa privativa da União”. Deve ser elaborado pedido liminar com fundamento no Art. 5º, § 3º, da Lei 9.882/99, com o objetivo específico de sustar a eficácia do Art. 11 e, por consequência, suspender o trâmite da representação por crime de responsabilidade oferecida em desfavor do Prefeito. Como pedido final, a peça deve requerer o julgamento pela procedência da arguição para declarar a incompatibilidade com a Constituição da República dos Artigos 11 e 12 da Lei Orgânica, de 30 de maio de 1985, do Município Alfa.


QUESTÃO 1 Um candidato a Presidente da República, em discurso durante a campanha eleitoral, fez as proposições a seguir para seus eleitores: i. que iria revogar imediatamente uma medida provisória nociva ao interesse público, que foi editada em 10 de setembro de 2001, antes, portanto, da promulgação da Emenda Constitucional nº 32/01 (que até hoje não foi apreciada pelo Congresso Nacional); ii. que iria editar medida provisória para modificar alguns artigos da Lei nº 6.815/80, mais especificamente aqueles que tratam da naturalização do estrangeiro residente no Brasil, bem como fixar novas regras processuais da Lei nº 8.078/90, que instituiu o Código de Defesa do Consumidor. A partir da hipótese apresentada, com base nas regras do processo legislativo brasileiro, responda aos itens a seguir. A) É constitucionalmente possível revogar uma Medida Provisória que tenha sido editada há vários anos e que ainda não tenha sido objeto de apreciação pelo Congresso Nacional, ou seja, não tenha sido rejeitada, nem convertida em lei, tal qual consta na primeira proposição feita pelo candidato? Justifique. (Valor: 0,65) B) A segunda proposição feita pelo candidato no sentido de editar Medida Provisória com o intuito de regular a naturalização do estrangeiro residente no Brasil, bem como fixar novas regras processuais do Código de Defesa do Consumidor encontra amparo constitucional? Justifique. (Valor: 0,60) Obs.: sua resposta deve ser fundamentada. A simples menção ao dispositivo legal não será pontuada. 


Gabarito Comentado pela FGV: A) Sim. O examinando deve destacar que a proposição desta MP teria amparo constitucional nos termos do Art. 2º da Emenda Constitucional nº 32/2001, que estabelece que as medidas provisórias antigas, editadas em data anterior à promulgação daquela EC, continuam em vigor até que venham a ser revogadas ou apreciadas pelo Congresso Nacional. Portanto, a proposição feita tem amparo constitucional. Com efeito, levando em consideração que a data da EC nº 32 é de 11 de setembro de 2001, é correto afirmar que a MP editada em 10 de setembro de 2001 ainda se encontra em vigor. É importante frisar que todas aquelas medidas provisórias editadas anteriormente à EC nº 32 de 11 de setembro de 2001 continuam em vigor até hoje, se não foram rejeitadas pelo Congresso Nacional ou revogadas por outra MP do Presidente da República. B) Não. Tal medida provisória seria duplamente inconstitucional. Em primeiro lugar, porque estaria regulando matéria vedada a medida provisória, nos termos do Art. 62, § 1º, inciso I, alínea a, ou seja, matéria relativa à nacionalidade, à cidadania e aos direitos políticos (situação jurídica do estrangeiro no Brasil). Em segundo lugar, tal medida provisória seria incompatível com a CRFB/88, nos termos do Art. 62, § 1º, inciso I, alínea b, isto é, estaria versando sobre matéria de Direito Processual Civil (Código de Defesa do Consumidor).

QUESTÃO 2 O Presidente da República edita medida provisória estabelecendo novo projeto de ensino para a educação federal no País, que, dentre outros pontos, transfere o centenário Colégio Pedro II do Rio de Janeiro para Brasília, pois só fazia sentido que estivesse situado na cidade do Rio de Janeiro enquanto ela era a capital federal. Muitas críticas foram veiculadas na imprensa, sendo alegado que a medida provisória contraria o comando contido no Art. 242, § 2º, da CRFB/88. Em resposta, a Advocacia-Geral da União sustentou que não era correta a afirmação, já que o mencionado dispositivo da Constituição só é constitucional do ponto de vista formal, podendo, por isso, ser alterado por medida provisória. Considerando a situação hipotética apresentada, responda, de forma fundamentada, aos itens a seguir. A) Segundo a Teoria Constitucional, qual é a diferença entre as denominadas normas materialmente constitucionais e as normas formalmente constitucionais? (Valor: 0,75) B) O entendimento externado pela Advocacia-Geral da União à imprensa está correto, sendo possível a alteração de norma constitucional formal por medida provisória? (Valor: 0,50) Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não confere pontuação. 


Gabarito comentado pela FGV: A) O examinando deverá responder que as normas materiais possuem status constitucional em razão do seu conteúdo, pois estabelecem normas referentes à estrutura organizacional do Estado, à separação dos Poderes e aos direitos e as garantias fundamentais, enquanto as normas em sentido formal só possuem o caráter de constitucionais porque foram elaboradas com o uso do processo legislativo próprio das normas constitucionais. B) O examinado deverá responder que o entendimento externado pela Advocacia Geral da União à imprensa está incorreto, pois, independentemente da essência da norma, todo dispositivo que estiver presente no texto constitucional, em razão da rigidez constitucional, só poderá ser alterado pelo processo legislativo solene das emendas constitucionais, tal qual previsto no Art. 60 da CRFB/88.

QUESTÃO 3 A Assembleia Legislativa do Estado X elaborou Lei Estadual que determina que os veículos apreendidos pelas polícias militar e civil, caso não sejam reclamados no período de três anos, serão levados a hasta pública, repartindo-se o produto do leilão entre o Estado e o Município. O Governador do Estado, preocupado com a constitucionalidade da lei, visto que ela atingirá patrimônio privado, consulta o Procurador Geral do Estado. Com base no caso apresentado, responda aos itens a seguir. A) A Lei Estadual está de acordo com as normas da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 ? (Valor: 0,65) B) O Governador do Estado X pode propor, perante órgão da União, alguma medida judicial visando à impugnação da Lei Estadual? Justifique. (Valor: 0,60) Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não confere pontuação. 

Gabarito Comentado pela FGV: A) O examinando deverá responder que estamos diante de um vício formal de constitucionalidade, pois a Lei Estadual viola o Art. 22, inciso I, da CRFB/88, que dispõe ser da competência privativa da União legislar sobre Direito Civil, já que trata de perda da propriedade. B) O examinando deverá responder que o Governador é um dos legitimados ativos à propositura de ADI, de acordo com o Art. 103 da CRFB. A pertinência temática está presente, sendo possível questionar esse ato normativo por meio de Ação Direta de Inconstitucionalidade, de acordo com o Art. 102, inciso I, a, da CRFB/88 e a Lei nº 9.868/99.

QUESTÃO 4 Após o pleito eleitoral, o Deputado Federal X, diplomado e empossado, resolveu trocar de legenda, alegando que as normas que disciplinam o instituto jurídico da fidelidade partidária ainda não foram editadas no Brasil. O Deputado Federal X também conseguiu convencer o Senador Y, diplomado e empossado, a trocar de legenda, usando os mesmos argumentos. Efetuada a mudança para outra legenda já existente, o partido que perdeu os seus políticos resolveu pleitear, junto ao Poder Judiciário, a perda dos respectivos mandatos. Com base na situação narrada, responda aos itens a seguir. A) A iniciativa do partido político de reaver o mandato do Deputado Federal X tem fundamento na CRFB/88? Justifique. (Valor: 0,65) B) A solução jurídica é a mesma para o caso do Senador Y? Justifique. (Valor: 0,60) Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas. A mera citação do dispositivo legal não confere pontuação. 


Gabarito comentado pela FGV: A) Sim. A jurisprudência do STF é firme no sentido de que, nos cargos sujeitos ao sistema proporcional (deputados federais, deputados estaduais e vereadores), previsto no Art. 45, caput, da CRFB/88, o mandato eletivo pertence ao partido político e não ao parlamentar. No caso em tela, o abandono de legenda pelo Deputado Federal X enseja a extinção do seu mandato parlamentar, porque não há a caracterização de justa causa, ou seja, mudanças na ideologia do partido ou criação de um novo partido político. Portanto, a iniciativa deve ser julgada procedente, em atenção às características do sistema proporcional, cuja ênfase é dada aos votos obtidos pelos partidos políticos e não pelos parlamentares. B) Não. A solução jurídica não deve ser a mesma, porque, nos cargos sujeitos ao sistema majoritário (presidente da república, governador, prefeito e senador), o mandato eletivo pertence ao parlamentar e não ao partido político. Nesse caso, o abandono de legenda pelo Senador Y não enseja a extinção do seu mandato parlamentar, porque o sistema majoritário se caracteriza pela ênfase na figura do candidato, daí a jurisprudência do STF no sentido da inaplicabilidade da regra de perda do mandato por infidelidade partidária. Portanto, a iniciativa deve ser julgada improcedente, em atenção ao princípio da soberania popular. Ou seja, no caso em tela, a mudança de partido feita pelo Senador Y, sem qualquer justa causa, não frustra a vontade do eleitor e não vulnera o princípio da soberania popular (Art. 1º, parágrafo único, e Art. 14, caput, ambos da CRFB/88).