22 de jun. de 2010

Controle de Constitucionalidade - Parte 1

O presente tópico é o último concernente à Teoria Geral da Constituição.
Todos os demais temas da Teoria Geral já foram esboçados em tópicos anteriores (onze tópicos, para ser mais exato) nesse pouco menos de um mês de "blog".
Pela extensão e importância do assunto, será a primeira vez que dividiremos um assunto em duas partes. Nessa primeira parte estudaremos o conceito e fundamento do controle, formas de inconstitucionalidade e formas de controle de constitucionalidade.
Conceito: Controle da constitucionalidade é a verificação da adequação vertical que deve ocorrer entre as normas infraconstitucionais e a Constituição. Trata-se de um exame comparativo entre um ato legislativo ou normativo e a "Lei Maior". Portanto, todo ato legislativo ou normativo que contrariar a Constituição Federal deve ser declarado inconstitucional.
O Controle configura-se no conjunto de órgãos e instrumentos desenvolvidos com o escopo de assegurar a supremacia formal da Constituição.
Fundamento: Encontra-se no conceito de supremacia da Constituição escrita, da existência de uma lei maior que se sobrepõe a todas as demais normas jurídicas existentes. A supremacia é decorrência da própria rigidez das Constituições escritas. Por demandar a norma constitucional um procedimento especial de alteração mais rigoroso que o das normas infraconstitucionais, todos os demais atos legislativos e administrativos são hierarquicamente inferiores. O que estiver em desacordo com a Constituição, ápice de todo o sistema jurídico, deve ser declarado inconstitucional.
Dois requisitos são fundamentais para que o controle de constitucionalidade seja realizado. a) a presença de uma Constituição rígida, da qual resulte a superioridade das normas constitucionais; b) existência de um órgão que efetivamente assegure a supremacia do texto constitucional (no Brasil, o Supremo Tribunal Federal).
Formas de Inconstitucionalidade: Decorre, em sentido estrito, da contrariedade entre uma determinada conduta do Poder Público e um preceito constitucional.
a) Quanto ao tipo de conduta:
-Inconstitucionalidade por ação: decorre de uma conduta positiva contrária a um comando constitucional. O Poder Público age ou edita normas contrárias à Constituição.
-Inconstitucionalidade por omissão: Deriva de uma conduta negativa. Encontra-se nos casos em que não sejam praticados os atos legislativos ou executivos necessários para tornar plenamente aplicáveis as normas constitucionais carentes de legislação regulamentadora.
b) Quanto a norma Constitucional ofendida:
-Inconstitucionalidade formal: Acontece quando o ato é produzido por autoridade incompetente ou em desacordo com as formalidades legais.
-Inconstitucionalidade material: Trata-se da produção de atos legislativos ou normativos que desrespeitem o próprio conteúdo das normas constitucionais.
c) Quanto à extensão:
-Inconstitucionalidade total: atinge uma lei ou ato normativo na íntegra.
-Inconstitucionalidade parcial: atinge apenas alguns dos dispositivos da lei ou ato normativo.
d) Quanto ao momento:
-Inconstitucionalidade originária: Quando a violação ocorre após a vigência da Constituição. Assim, o ato encontra-se viciado desde o início.
-Inconstitucionalidade superveniente: O ato é elaborado, inicialmente, de acordo com a Constituição. Não obstante, em razão da elaboração de uma nova Constituição ou de uma emenda, faz com que ele se torne incompatível (para o STF trata-se de não-recepção que implica em revogação da norma anterior pela Constituição)
e) Quanto ao prisma de apuração:
- Inconstitucionalidade direta ou antecedente: Acontece quando o juízo de inconstitucionalidade resulta do confronto direto entre a norma questionada e a Constituição. Não há ato normativo intermediário.
- Inconstitucionalidade indireta: Quando há uma norma intermediária entre o ato normativo analisado e a Constituição. Se o vício da norma decorre de inconstitucionalidade de outra da qual ela depende, denomina-se inconstitucionalidade consequente. Caso a inconstitucionalidade resulte da violação de uma norma infraconstitucional interposta entre o ato questionado e a Constituição, encontramos uma inconstitucionalidade reflexa ou por via oblíqua.
Formas de Controle de Constitucionalidade: O Controle de Constitucionalidade das leis e atos normativos pode exercido da variadas formas.
a) Quanto ao momento: Pode ser preventivo ou repressivo. Nas duas hipóteses, o exercício poderá ser feito pelo Legislativo, Executivo ou Judiciário.
-Controle Preventivo: Tem por objetivo evitar que ocorra uma lesão à Constituição, podendo ocorrer antes da promulgação ou da emenda à Constituição
-Controle Repressivo (Típico): Tem por escopo garantir a supremacia constitucional, através da invalidação ou não aplicação de leis e atos dos poderes públicos. Só poderá ser exercido após a entrada em vigor da lei ou da emenda, ou seja, após a publicação ou, quando houver, o período de vacância.
b) Quanto à natureza do órgão: Dá-se em conformidade ao órgão encarregado de exercer o controle de constitucionalidade
-Controle político: É exercido por órgão não pertencente ao Poder Judiciário
-Controle judicial, jurisdicional ou judiciário: É realizado pelos integrantes do Poder Judiciário.
-Controle misto: Submete-se certas categorias de leis ao controle político e outras ao controle jurisdicional.
c) Quanto à finalidade do controle:
- Controle concreto (incidental/por via de exceção): Ocorre. quando a constitucionalidade é apreciada em um processo judicial, cujo objetivo é a solução de uma celeuma envolvendo direitos subjetivos.
- Controle abstrato (por via de ação, direta ou principal): É exercido em tese, independentemente de um caso concreto. O objeto da ação é a própria declaração da inconstitucionalidade do ato legislativo ou normativo.
d) Quanto ao tipo de pretensão deduzida em juízo:
-Processo constitucional objetivo: Trata-se do controle que visa principalmente à proteção da ordem constitucional.
-Processo constitucional subjetivo: Trata-se do controle exercido diante de um caso concreto, haja vista sua finalidade precípua: a proteção de direitos subjetivos.
e) Quanto à competência: Classificação de acordo com o órgão jurisdicional competente para o exercício do controle.
-Controle difuso: Exercido por todos os integrantes do Judiciário. Qualquer juiz ou tribunal pode declarar a inconstitucionalidade no caso “sub examine” (Estados Unidos).
-Controle concentrado: Só é exercido por um Tribunal Superior do país ou por uma Corte Constitucional (Alemanha).
O Brasil adota ambos os critérios, ou seja, o controle jurisdicional misto (ou combinado).

16 de jun. de 2010

Nova Constituição e Ordem Jurídica Anterior

Ao estudarmos o presente tema, deparamo-nos com a relação do direito com o passado, presente e futuro.
O Direito Constitucional Intertemporal cuida dos conflitos temporais decorrentes da nova constituição.
Com o ingresso de uma nova Constituição no ordenamento jurídico de um Estado, presencia-se os seguintes fenômenos:
1- Recepção: A legislação infraconstitucional que não for contrária à nova ordem constitucional é por ela recepcionada, admitida como válida. Não seria razoável inutilizar toda a legislação ordinária construída ao longo dos tempos
Dessarte, segundo o fenômeno da recepção, continuam válidos todos os atos legislativos editados na vigência do ordenamento jurídico anterior, sendo recebidos e adaptados à nova ordem jurídica, não precisando serem reeditados, recriados ou refeitos, mediante outra manifestação legislativa.
A legislação infraconstitucional recebe a natureza que a nova ordem constitucional reservou para a matéria (Ex: CTN foi recepcionada como lei complementar, embora tenha sido criada sob a forma de lei ordinária)
2 - Repristinação: Presencia-se o fenômeno da repristinação quando uma lei volta a vigorar, eis que revogada aquela que a revogara. A Lei de Introdução ao Código Civil, em seu art. 2º,§3º, veda expressamente a repristinação: “Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência”. Também não se admite o fenômeno da repristinação no direito constitucional, salvo se houver expressa previsão no texto da nova Constituição. A legislação infraconstitucional revogada pela vigência de uma Constituição não se restaura pelo surgimento de uma nova Lei Maior.
3 - Desconstitucionalização: É o fenômeno segundo o qual as normas da antiga Constituição, desde que compatíveis com a nova sistemática jurídica, permanecem em vigor, mas com a forma de lei infraconstitucional.
Como regra, não existe no Brasil. Porém poderá ser imposta pelo Poder Constituinte Orignário se , expressamente, a requerer.
4 - Recepção material de normas constitucionais: É a persistência de normas constitucionais anteriores que conservam, em caráter secundário, a qualidade anterior de normas constitucionais.
Essas normas são recebidas por prazo determinado, em decorrência de seu caráter precário.
Ex: art. 34, caput e § 1º do ADCT.
5 - Revogação: As leis não recepcionadas pela nova ordem jurídica perdem a sua vigência, por força dos efeitos ab-rogativos do ditame da revogação. Não é necessário preceito revogatório expresso para que sejam assim; Assim, todas as pautas de comportamento desconformes com o novo texto maior saem da ordem jurídica, automaticamente.
A simples manifestação constituinte de primeiro grau concretiza, imediatamente, o ditame da revogação, haja vista que “Lex posterior derogat priori" (lei posterior derroga a anterior).
6 - Constitucionalidade Superveniente: A constitucionalidade superveniente ocorre quando uma norma inconstitucional ao tempo de sua edição, torna-se compatível com a Lei Maior devido à mudança do parâmetro constitucional. Para o STF, tal fenômeno é impossível (STF - RE nº 346.084/PR, rel. Min. Marco Aurélio).
7 - Mutação Constitucional: Trata-se de um processo informal de modificação do conteúdo, sem que ocorra qualquer alteração em seu texto. É o que ocorre com o surgimento de um novo costume constitucional ou quando o STF altera o sentido de uma norma da Constituição por meio da interpretação.
8 - "Vacatio Constitutionis":É o período de tempo entre a publicação de uma nova Constituição e a sua entrada em vigor.

14 de jun. de 2010

Do Poder Constituinte

1 - Conceito: É o poder de criar uma nova Constituição, assim como de reformar a vigente. Trata-se da manifestação soberana da vontade política de um povo, social e juridicamente organizado.
2 - Titularidade: O titular do Poder Constituinte, segundo o abade Emmanuel Sieyès (na obra "O que é o terceiro Estado?"), um dos precursores dessa doutrina, é a nação. Hodiernamente, entretanto, é predominante que a titularidade do poder constituinte pertence ao povo, pois o Estado decorre da soberania popular, cujo conceito é mais abrangente do que o de nação.
3 - Poder Constituinte Originário, de 1º Grau ou Genuíno: Constitui-se em um poder político, supremo e originário, encarregado de criar a primeira Constituição de um Estado (histórico) ou de elaborar um novel texto constitucional (revolucionário). Ao contrário dos atos praticados pelos poderes constituídos, cuja análise ocorre na seara da legalidade (constitucionalmente formal e material), a do poder constituinte deve ser feita no plano da legitimidade.
Esse poder só será legítimo quando exercido por representantes de seu titular (povo ou nação) e nos limites de sua delegação.
O Poder Constituinte caracteriza-se por ser inicial, ilimitado, autônomo e incondicionado.
O Poder Constituinte é inicial, pois sua obra – a Constituição – é a base da ordem jurídica.
O Poder Constituinte é ilimitado e autônomo porque não está limitado pelo direito anterior, não precisando respeitar os limites postos pelo direito positivo antecessor.
O Poder Constituinte também é incondicionado, pois não está sujeito a qualquer forma prefixada para manifestar sua vontade.
4 - Poder Constituinte Derivado, de 2º Grau, Secundário, Relativo ou Limitado: O Poder Constituinte derivado está inserido no bojo da Constituição, ou seja, decorren de uma regra jurídica de autenticidade constitucional. Por conseguinte, conhece limitações constitucionais expressas e implícitas e é passível de controle de constitucionalidade.
Apresenta as características de derivado, subordinado e condicionado. É derivado porque obtém sua força do Poder Constituinte originário; subordinado porque se encontra limitado pelas normas expressas e implícitas do texto constitucional, às quais não poderá violar, sob pena de inconstitucionalidade; e, por fim, condicionado porque seu exercício deve seguir as regras previamente estabelecidas no texto da Constituição Federal.
O poder Constituinte Derivado é dividido em
4.1 - Poder Constituinte Derivado Reformador: trata-se da possibilidade de alterar o texto constitucional, respeitando-se a regulamentação especial prevista na Constituição Federal e será exercitado por determinados órgãos com caráter representativo. No Brasil, exercitar-se-á pelo Congresso Nacional. Só estará presente nas Constituições rígidas.
O poder derivado reformador, responsável pela modificação das normas constitucionais através de emendas, está disciplinado no art. 60 da Constituição de 1988.
Vejamos as limitações ao Poder Constituinte Derivado Reformador:
a) Limitações Temporais: É uma proibição de reforma de determinados dispositivos durante um certo período de tempo após a promulgação da Constituição, com o escopo de assegurar a sua estabilidade e evitar alterações precipitadas e desnecessárias. A atual Constituição brasileira não prevê esta espécie de limitação para o poder reformador.
b) Limitações Circunstanciais: São normas aplicáveis a situações excepcionais, nas quais a livre vontade do poder reformador possa estar corrompida. Enquanto tais situações permanecerem vigentes, é proibida qualquer modificação no texto constitucional, como ocorre durante o período de intervenção federal, estado de defesa e estado de sítio (art. 60, §1º)
c)Limitações Formais (ou processuais): São limitações concernentes ao órgão competente e ao procedimento a serem observados na modificação da Constituição. Alguns autores a classificam como uma limitação implícita.
As limitações formais subjetivas são relacionadas ao órgão competente, como no caso dos legitimados para propositura de emenda constitucional (art. 60, incisos I a III).
As limitações formais objetivas são referentes ao processo e às formalidades de elaboração da proposta (art. 60, §§2º,3º e 5º)
d) Limitações Materiais (ou substanciais): As limitações materiais podem ser analisadas sob dois prismas.
O primeiro refere-se à possibilidade de inserção de qualquer matéria no texto constitucional (limites inferiores). Tendo em vista a inexistência de matéria constitucional estabelecida pelo legislador constituinte, não existe nenhum impedimento a que uma nova matéria seja inserida no texto constitucional.
No tocante à alteração do conteúdo constitucional, existem alguns limites impostos pelo poder constituinte originário na tentativa de preservar a identidade material da Constituição, impedindo-se a modificação de determinados conteúdos pertencentes ao seu núcleo essencial (limites superiores). Tais limitações exteriorizam-se nas cláusulas pétreas, que podem ser expressas (art. 60, §4º) ou implícitas.
As cláusulas pétreas implíicitas são aquelas que apesar de não estarem previstas textualmente (art. 60, §4º), também não podem ser objeto de alteração. Como exemplo, podemos destacar a proibição de revogação do art. 60 da Constituição da República (Pontes de Miranda, Pinto Ferreira e Nelson Souza Sampaio); a soberania nacional e o pluralismo político (Paulo Bonavides); a imunidade tributária recíproca (STF); e a dignidade da pessoa humana.
4.2 - Poder Constituinte Derivado Decorrente: refere-se à possibilidade que os Estados – membros possuem, em razão de sua autonomia político – administrativa, de se auto-organizarem por meio de suas respectivas constituições estaduais, sempre obecendo as regras limitativas estabelecidas pela Constituição Federal. A Constituição da República estabelece que os Estados-membros regem-se pelas constituições que adotarem (art. 25), elaboradas pelas respectivas Assembléias Legislativas com poderes constituintes (ADCT, art. 11).
4.3 - Poder Constituinte Derivado Revisor: A atuação do poder derivado revisor está disciplinada no art. 3º do ADCT.
Há duas observações pertinentes: a) A revisão só poderia ser realizada após cinco anos, contados da promulgação da Constituição de 1988. a) A revisão se realiza pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão unicameral (ADCT, art. 3º).

10 de jun. de 2010

Eficácia das normas constitucionais

Antes de começarmos a discorrer sobre o presente tópico é bom lembrar que todas as normas constitucionais possuem eficácia jurídica, até mesmo as normas programáticas.
Existem diversos tipos de classíficação da eficácia das normas jurídicas.
Maria Helena Diniz divide as normas constitucionais com relação à sua eficácia em: a) normas supereficazes ou com eficácia absoluta; b) normas com eficácia plena; c) normas com eficácia relativa restringível; d) normas com eficácia relativa complementável ou dependente de complementação legislativa.
Celso Ribeiro Bastos e Carlos Ayres Britto classificam as normas constitucionais em normas de aplicação (irregulamentáveis e regulamentáveis) e normas de integração.
Rui Barbosa as classifava em normas auto-executáveis e não executáveis.
Pontes de Miranda distinguia as regras jurídicas em bastantes em si e não bastantes em si.
Uadi Lammêgo Bulos menciona as normas de eficácia exaurida.
Não obstante, a visão que iremos estudar é a visão do Ilustre Professor José Afonso da Silva, haja vista tratar-se da classificação mais conhecida.
José Afonso divide as normas em:
a) Normas constitucionais de eficácia plena. São aquelas de aplicabilidade imediata, direta e integral, não dependendo da edição de qualquer legislação ulterior. Produzem efeitos imediatos e dispensam a edição de normas regulamentadoras. Exemplos: o mandado de injunção, o “habeas data” e o mandado de segurança coletivo foram utilizados mesmo antes da regulamentação por legislação ordinária.

b) Normas constitucionais de eficácia contida. Aquelas de aplicabilidade imediata, mas cujos efeitos podem ser limitados pela legislação infraconstitucional. Produzem efeitos imediatamente, mas estes podem vir a ser limitados pela norma infraconstitucional que vier a ser aprovada. Michel Temer prefere conceituar essas normas como de eficácia redutível ou restringível. Exemplo: a liberdade de profissão assegurada pela Constituição Federal, no art. 5º, XIII, com a seguinte restrição: “atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”.

c) Normas constitucionais de eficácia limitada. Aquelas que dependem de complementação de norma infraconstitucional para que se tornem exeqüíveis. Abrangem as normas declaratórias de princípios institutivos ou organizativos e as declaratórias de princípios programáticos. As primeiras estabelecem o esquema geral de estruturação e atribuições de órgãos, entidades ou institutos públicos, para que o legislador ordinário as regulamente. Normas programáticas são as que fixam princípios, entidades e metas a serem alcançadas pelos órgãos do Estado. Exemplos: direito à saúde (CF, art. 196), à educação (CF, art.205), à cultura (CF, art. 215) e ao esporte (CF, art. 217). As normas constitucionais programáticas também possuem eficácia jurídica imediata, ainda que mínima, mesmo antes da edição de qualquer legislação complementar, eis que: a) revogam a legislação ordinária que seja contrária aos princípios por elas estabelecidos; b)evitam a edição de leis contendo dispositivos contrários ao mandamento constitucional; e c) institui um dever legislativo para os poderes constituídos, que podem incidir em inconstitucionalidade por omissão caso não elaborem a regulamentação infraconstitucional que possibilite o cumprimento do preceito constitucional.

8 de jun. de 2010

Preâmbulo Constitucional

O palavra preâmbulo deriva do latim "preambulu", sendo a parte introdutória ou preliminar de uma Constituição.

"Nos dizeres de Peter Häberle, os preâmbulos são 'pontes do tempo`, exteriorizando as origens, os sentimentos, os desejos e as esperanças que palmilharam o ato constituinte originário" (El Estado Constitucional, Trad. Héctor Fix-Fierro e Rolando Tamayou. México: Universidad Nacional Autónoma de Mexico, p. 276, citado por BULOS, Uadi Lammêgo Bulos, Curso de Direito Constitucional, 2007, São Paulo: Saraiva. p. 380).

Alexandre de Moraes assevera que "o preâmbulo de uma Constituição pode ser definido como documento de intenções do diploma, e consiste em uma certidão de origem e legitimidade do novo texto e uma proclamação de princípios, demonstrando a ruptura com o ordenamento constitucional anterior e o surgimento jurídico de um novo Estado. É de tradição em nosso Direito Constitucional e nele devem constar os antecedentes e enquadramento histórico da Constituição, bem como suas justificativas e seus grandes objetivos e finalidades." (Direito Constitucional, 21ª ed., 2007, São Paulo: Saraiva. p. 15)

Três são as posições apontadas acerca da natureza jurídica do preâmbulo: a) tese da irrelevância jurídica: o preâmbulo encontra-se no domínio da política, sem relevância jurídica; b) tese da plena eficácia: possui a mesma eficácia jurídica das normas constitucionais, sendo, no entanto, apresentado de forma não articulada; c) tese da relevância jurídica indireta: ponto médio entre as anteriores, já que, muito embora participe “das características jurídicas da Constituição”, não deve ser confundido com o articulado.
A terceira posição é a majoritária no nosso ordenamento jurídico
O Ministro Celso de Mello assevera que “o preâmbulo...não se situa no âmbito do Direito, mas no domínio da política, refletindo posição ideológica do constituinte...Não contém o preâmbulo, portanto, relevância jurídica. O preâmbulo não constitui norma central da Constituição, de reprodução obrigatória na Constituição do Estado-Membro. O que acontece é que o preâmbulo contém, de regra, proclamação ou exortação no sentido dos princípios inscritos na Carta...Esses princípios sim, inscritos na Constituição, constituem normas centrais de reprodução obrigatória, ou que não pode a Constituição do Estado – membro dispor de forma contrária, dado que, reproduzidos, ou não, na Constituição, incidirão na ordem local...” (Julgamento da ADIn 2.076 – AC, rel. Min. Carlos Velloso, 15.08.2002, DJ, 08.08.2003, e Infs. STF ns. 277/2002 e 320/2003, 08 a 12.12.2003.)
O Supremo Tribunal Federal entende que o preâmbulo, por não possuir força cogente nem caráter normativo, não pode prevalecer contra o texto da Constituição, nem servir de parâmetro para a declaração de inconstitucionalidade (STF – MS (MC) nº 24.645/DF).
Como exemplo, a expressão "sob a proteção de Deus" não é norma de reprodução obrigatória na Constituição estadual, não tendo força normativa (ADI 2.076 –AC, rel. Min. Carlos Velloso).
Por conseguinte, ao preâmbulo é atribuído o caráter de diretriz interpretativa.